Dívida alta e competição acirrada impõem desafios às teles

Forte geração de caixa contribui para setor garantir investimentos necessários em novas tecnologias, como 3G, e fazer frente ao maior endividamento

Por Michelly Chaves Teixeira


Amparado por uma forte geração de caixa e uma gestão financeira conservadora, o setor de telecomunicações foi um dos que mais resistiu aos efeitos da crise financeira internacional, que desde setembro de 2008 vem provocando no Brasil cortes na produção industrial e queda no consumo. Mas isso não significa que as operadoras de telefonia estejam livres de desafios. Ao contrário.

Um dos principais contratempos neste ambiente de crédito escasso diz respeito ao endividamento das operadoras de telecom, que superava os R$ 33 bilhões ao final de março, alta de 188% sobre igual período de 2008. Comparativamente à dívida líquida do encerramento de 2008, o acréscimo é de 38,5%, segundo demonstrações financeiras de sete empresas do ramo: Telefônica, Oi/BrT, Embratel, GVT, Vivo, TIM e Net.

Boa parte deste salto foi provocada pela Oi, que recorreu ao mercado para financiar a compra da Brasil Telecom (BrT) e, ao final de março, registrava uma dívida líquida acima de R$ 19 bilhões ante R$ 2,5 bilhões de um ano antes. Esse endividamento vai subir no segundo semestre, em razão da oferta pública de ações (OPA) direcionada aos detendores de ações ordinárias da BrT, no valor de R$ 3,5 bilhões. Espera-se, contudo, que o grau de alavancagem da Oi termine 2009 perto de duas vezes o valor da geração de caixa medida pelo Ebitda.

Conta a favor da Oi, assim como das demais operadoras, a forte geração de caixa do setor, situação que traz algum alento a investidores neste contexto de restrição das fontes de financiamento. O caixa destas companhias superou os R$ 12 bilhões no primeiro trimestre de 2009. A redução dos juros básicos pelo Banco Central (BC), bem como a estabilidade do dólar - que afeta diretamente os custos de aparelhos celulares e parte dos investimentos em rede de infraestrutura -, devem reduzir as pressões sobre as despesas financeiras ao longo do ano. Além disso, a gestão financeira conservadora, praxe no setor de telecomunicações, deve ajudar as teles a atravessar este cenário econômico conturbado.

Também colocará o setor à prova em 2009 o acirramento da concorrência nas telecomunicações, que ganhou contornos bélicos em 2008. Vários fatores contribuíram para a mudança do quadro competitivo. A união de forças entre Oi e BrT criou um grupo com forte capacidade de investimento e pretensões comerciais bastante agressivas, chacoalhando não só a área de atuação destas duas concessionárias, mas também o mercado paulista, onde a Oi entrou com a oferta de telefonia celular de segunda e terceira gerações (2G e 3G).

A portabilidade numérica, o ingresso de operadoras móveis em novas áreas de cobertura - Vivo e Claro tiraram da TIM a exclusividade na cobertura nacional - e o lançamento da banda larga das celulares também impuseram um novo ritmo à competição. Por mais que a tecnologia 3G ainda seja cara e a qualidade dos serviços deixe a desejar, o lançamento da internet rápida pela rede móvel criou um concorrente para a banda larga das teles fixas. Estas empresas, para não perder terreno, tiveram que investir pesado em expansão da infraestrutura de acesso e em redes capazes de suportar velocidades de conexão mais altas, como fibra óptica.

Soma-se à concorrência mais acirrada o fato de que, em mercados como o de telefonia móvel, a disseminação dos serviços está próxima da saturação. Dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) mostram que, em abril de 2009, existiam no País 154,596 milhões de linhas móveis, o equivalente a quase 81 usuários por grupo de 100 habitantes. O número de linhas fixas também vem se reduzindo, sendo substituídas por telefonia celular e de voz sobre protocolo de internet (IP). Para compensar uma esperada desaceleração no ingresso de novos assinantes, as operadoras terão, cada vez mais, de apostar em serviços capazes de agregar valor. A venda combinada de serviços, com telefonia, internet rápida e tevê por assinatura no mesmo pacote, se mostra uma tática eficaz, pois garante às teles sinergias operacionais e dá aos consumidores vantagens financeiras.

Diante da constatação de que a rivalidade entre as teles tende a se agravar, o mercado ficou com a certeza de que não poderá se furtar aos investimentos, sob pena de perder clientes. Além de cumprir metas de cobertura definidas pelo governo, estas empresas terão de expandir a infraestrutura existente, tornando-a mais robusta para comportar o aumento do tráfego de dados e a entrada de novos clientes, ainda que em ritmo mais modesto. Para contornar todos os obstáculos que 2009 lhes reserva, as operadoras precisarão de uma estratégia comercial bem amarrada para preservar a base e buscar clientes na concorrência.

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